Educação e Agroecologia

Nasce a primeira turma de Agentes Populares de Saúde no Campo do Pampa

A iniciativa é uma parceria do MST com a Fiocruz; turma prestou homenagem a Ana Primavesi

Por Katia Marko / MST no RS
Da Página do MST

A primeira turma de Agentes Populares de Saúde com ênfase em Agroecologia no Bioma Pampa se formou na última sexta-feira (23), em Candiota, no Rio Grande do Sul. O nome escolhido presta homenagem à agrônoma e escritora Ana Primavesi, pioneira na compreensão do solo como um organismo vivo e referência mundial na área da agroecologia.

O evento teve a participação de assentados e acampados da região de São Gabriel, Livramento, Hulha Negra e Candiota, além da dirigente estadual do MST e coordenadora da iniciativa pelo movimento, a assentada Salete Carollo. Também mobilizou a comunidade local e contou com a presença de autoridades, incluindo cinco vereadores de diferentes municípios e a deputada federal Maria do Rosário (RS), que certificou os e as educandos/as. A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), responsável pela formação, também esteve presente.

Conforme explica o dirigente responsável pelo Setor de Saúde do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Sérgio dos Reis Marques, conhecido como Chocolate, a iniciativa é uma parceria do MST com a Fiocruz e busca o apoio de mandatos populares.

“A deputada federal Maria do Rosário (PT) fez uma destinação de verba para a Fiocruz, e a Fiocruz canalizou essa verba na perspectiva do projeto. A Fiocruz é a detentora do projeto que é aplicado em áreas de assentamento, nesse tripé de parceria (recurso público, instituição coordenadora/acompanhadora)”, afirma.

Em suas redes sociais, Rosário destaca que foi convidada a participar da formatura de Agentes Populares de Saúde do Campo, onde teve a honra de fazer parte da entrega dos diplomas.

Além da turma já formada, há mais um curso acontecendo na região Centro-Missões (Missões, Jóia, Tupanciretã, Castilho) e outro planejado para a região Sul (Piratininga, Canguçu, Pedras Altas). Estão planejadas um total três turmas para acontecer no Rio Grande do Sul.

Criada na pandemia, ideia evoluiu

Foto: Divulgação MST no RS

Como lembra Chocolate, a iniciativa surgiu no período da pandemia da covid-19. “A ideia inicial era ter pessoas capazes de contribuir com orientações durante a fase da covid-19, especialmente nas comunidades rurais de assentamento, onde o Estado tinha dificuldade de chegar. O objetivo era ter pessoas capacitadas na prevenção da covid e em tudo o que fosse necessário para diminuir os impactos da pandemia nessas comunidades. Posteriormente, a iniciativa também migrou para as periferias com a mesma perspectiva.”

Mas, segundo ele, com o tempo, essa proposta evoluiu para uma ideia mais ampla, buscando promover espaços para debater a saúde num aspecto mais vasto com as pessoas ligadas ao campo, no caso do MST. “A perspectiva ou a ser a da saúde para além do adoecimento.”

A turma Ana Primavesi estudou o Pampa, como reflete Chocolate, “um bioma que não é reconhecido como tal e está sendo extinto pela ganância do capital e pelo modelo de desenvolvimento do agronegócio baseado no monocultivo”.

Foto: Divulgação MST no RS

A base do curso Agentes Populares do Campo, neste contexto, foi no estudo da agroecologia a partir do Bioma Pampa. Os conteúdos estudados abrangem o reconhecimento do bioma (quem vive nele, como vivem, hábitos culturais), como o capital age sobre ele (com veneno, monocultivo e seus efeitos destrutivos), e as formas de resistência dos povos que fazem parte desse território (comunidades rurais, quilombolas, assentados).

Segundo Chocolate, o público-alvo são as famílias sem-terra organizadas pelo MST, incluindo lideranças, jovens e mulheres que vivem nesse território e possuem alguma prática relacionada à sua vivência territorial. “Entre os participantes formados, há apicultores, pessoas que lidam com extrativismo, com gado, e outras práticas relacionadas à vivência no bioma a partir da agroecologia.”

Ele conta que os temas estudados incluem bioinsumos, impactos do veneno, processos de comercialização e agroindustrialização de produtos para agregar valor, e perspectivas de intercooperação entre as famílias para encontrar mercado e agregar valor ao produto local. “Todos os temas são analisados na perspectiva de identificar o que existe e buscar alternativas para resistir ao avanço do agronegócio sobre o território.”

Quem são os agentes populares de saúde

Foto: Divulgação MST no RS

Segundo informa a Fiocruz, os Agentes Populares de Saúde do Campo (AgPopSC) são voluntários que trabalham em comunidades rurais, promovendo a saúde e a participação popular no SUS. São formados pela Fiocruz e outros parceiros, como o MST, e atuam na vigilância popular em saúde, educação popular em saúde e promoção de direitos sociais.

São formados por meio de cursos e oficinas que capacitam os voluntários para atuar como promotores de saúde, educadores populares e articuladores de redes de apoio nas comunidades.

A parceria entre o PSAT/Fiocruz Brasília e o MST tem como base a Agroecologia na Vigilância Popular em Saúde (VPS), promovendo a saúde e o cuidado com o território e o meio ambiente nos estados do Ceará, Distrito Federal, São Paulo e Rio Grande do Sul.

Os agentes têm atuado no fortalecimento da autonomia das comunidades, promovendo práticas de agroecologia e contribuindo para a soberania alimentar e ambiental.

Foto: Divulgação MST no RS

O curso de formação de Agentes Populares teve início no Ceará, entre 2020 e 2021, onde foi distribuído álcool 70%, máscaras e foram realizadas oficinas de produção de sabão. Mais de 750 famílias e 2 mil pessoas foram beneficiadas com práticas que uniam a promoção de quintais produtivos e a distribuição de alimentos em resposta à crise da covid-19. Essa iniciativa expandiu-se para outras regiões, como o Distrito Federal, onde mais de 100 agentes foram formados, resultando na criação de sistemas agroflorestais, hortas comunitárias e reuso de água, práticas essenciais para a promoção da saúde sustentável.

Em São Paulo, a formação de agentes nos assentamentos Rosa Luxemburgo, Fazenda Pirituba, São Bento e Mário Lago começou em 2023, consolidando a integração entre saúde, agroecologia e a participação popular na promoção de territórios mais saudáveis.

“O MST é um dos principais parceiros para mobilização e aproximação comunitária. Ao longo dessas quatro décadas, lutou pelo cumprimento da função social da terra, produtiva e sustentável, beneficiando mais de 600 mil famílias assentadas em 24 estados do Brasil. Da experiência com os Agentes, a importância do movimento se apresenta como uma força motriz para o desenvolvimento das políticas de promoção da saúde e da agroecologia, reforçando a participação ativa das comunidades no cuidado coletivo com a saúde e o meio ambiente”, destaca a Fiocruz.

*Editado por Fernanda Alcântara